terça-feira, 23 de outubro de 2012

O TEMPO ORGÂNICO DO MUTUCA


 
A convite de Paulo Nazaré, fomos eu e Carol conhecer a casa de um morador de Altamira. Estava eu em visita a primeira Residência RAM em Altamira, MG. A conversa com Seu Joaquim me lembrava dum tio por parte de mãe que se chamava  Benedito.  Tinha bigode feito seu Joaquim, rosto fino e forte.  A fala era diferente pelo tom de voz.  Benedito, meu tio matuto, era engraçado de fala mansa e grossa. Da voz grossa lembro-me da vez em que ria quando do dia que eu olhando pras tetas duma vaca tomei uma chuva de esterco pela fresca cabeça. Benedito ria até, só de lembrar a cena.  Seu Joaquim só lembrava meu tio pelo bigode e postura. Na verdade me pareceu bem diferente com outras semelhanças. Falava pouco. Respondia em frases curtas. Às vezes uma palavra era resposta. Outras um aceno de cabeça. Gente muito boa seu Joaquim.



Na sala onde estávamos havia duas cadeiras, um banco, sela e arreio pendurados na parede e uma foto dos pais de Joaquim. Casa de Adobe. Depois chegou o irmão com uma picareta na mão que acabara de talhar. Bico largo pra descavar raiz de bananeira. Proseamos sobre a feitura da picareta. Ele ao contrário do irmão falava bastante. E ai foi que na casa do seu Joaquim num tinha café, mas a o irmão tinha. Fomos pra lá conhecer a casa do irmão de Joaquim. Tomamos café e ouvimos a história de vida e amor do irmão desde que saiu de Altamira até que voltou e construiu aquela casa onde proseamos. Desse tempo que conversamos de ideias trocadas, nem se sabia no que ia dar aquela estadia em Altamira. Apenas passada a primeira noite.  


 

Era domingo e acompanhamos Marlúcia e Adriana que iam moldar tijolos de Adobe numa fazenda que tinha boa terra. Fomos e quaramos aqueles tijolos de barro e estrume. 



Estavam ainda muito úmidos e precisavam mudar de lugar. Deviam ficar pelo menos mais sete dias pra secar e poder levantar a  parede.  Parede de duas janelas pra se olhar horizonte de agachar. 
Virado os tijolos os pés se refrescam n’água fria, muito fria.














O dia já vai acabar e é hora de voltar. Barro que vira parede que vira janela que abre cortinas de Tucamarela. Foi que depois de pronto uma só vaca quis olhar o que teria ali no buraco de janela.



O dia amanheceu rosa e verde. Amarelo. Nesse dia foi que uma cadela banhada de ervas num tanque sorriu como se tivesse desejos.  


No vizinho se trocava o telhado inteiro de telha e madeira tudo novo pra chuva que podia chegar. A chuva não chegou. Mas o telhado ficou pronto naquele dia mesmo. Todo pronto.


No fim da tarde a cachoeira era véu de nuvem. No céu corria solto o Rei urubu em seu reinado de vales e bananeiras.



Pra caminhada bem cedo fizemos parada eu, Carol e Estan na flor de cachimbo, solta de esguio filete, uma tromba que antes explodia em fiapos a branca luz do dia.







Dali, tentativas e tentativas de imagens estáticas que em si revelam o tempo perdido. Há tempo perdido! 



Pétalas amarelas por caminhos não percorridos de dedos delicados que recolhem uma a uma outra até encher as mãos em concha.




Corre água corre pedra malhada tatuada de liquens de mútua relação simbiótica. Teias que unem espaço pau a pique terra onde pisamos e seguimos caminhos não despercebidos por flores de Cipós de São Jorge que se amarram pra erguer casa. Samambaias douradas no horizonte seco de inverno de sol a pino. Deixando pegadas na areia fina a caminhada continua Sempre Viva. 











O Cerrado daquelas Altamiras geram ramos verdes fractais ponteados de lilás. Aquelas flores amarelas, antes no caminho, encontram ninho e pousam em palmas de mão dentro do oco do tronco.






Na fúria da descida o fim na porteira desfocada pelo brilho contra luz da floresta mágica.



Porteira fechada na chegada recepção de tropeiros bois cachorro e família. Podemos agora receber aquela ligação do celular. Estamos de volta ao mundo real onde o Brasil foi esculpido na lagoa particular.




  



Janela aberta sorriso lindo podemos fumar o cachimbo da paz com Anna Arbo enquanto trabalhamos pisando em corações moles de pedra.




Formas de matéria prima orgânica. Ninhos guardam tentativas. O barro da terra enquadra o horizonte.  Assim em quadro, o tempo permanece e nada fica congelado. A corrente de água fria, muito fria avisa do perigo adiante: “Usuários , vamos preservar a passarela, não fazendo-a de balanço, se possível passe um de cada vez. Se soubermos usá-la teremos sempre!” Em Altamira acontece de balançar e ouvir cacarejos do galo azul como na litografia  “Soleil Vert” de Moebius. Primos irmãos deste mesmo galo, em forma e variadas cores, do reino dos bichos domésticos em quadrinhos, também cisca nos quintais dali.

Passaram-se quatro dias, assim esta no calendário. Não sei dizer quanto tempo realmente passamos neste lugar.